sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Um Poeta

.
Os corredores do colégio estavam finalmente ficarma vazios.

Rogério tamborilou os dedos sobre o corrimão desgastado que acompanhava a escada e o levava para fora. Alcançando a rua parou, voltou-se para o prédio que acabara de deixar. Rememorou o caso que tivera com a então jovem apresentadora de TV, ainda aluna. Não dava, ela tinha o buço avantajado demais. Parou no carrinho de doces no meio da rua e deliciou-se com a barra de mocotó que comprou. Ser bedéu não fazia mais parte de sua vida!

Sempre, de alguma maneira, as atividades que tentou em seguida esbarravam numa incongruência com seu perfil: foi ser modelo, desfilando de cueca seu corpo malhado, em supermercados e magazines para delírio de jovens senhoras e outras nem tanto assim. Não deu certo - era tímido demais. Tentou a carreira (se é que é possível chamar assim) de "stripper" numa conhecida casa de shows (acho que é a única) - o Clube das Mulheres - mas não levou o intento muito adiante. Ápós algumas apresentações travestido de bombeiro, de cavaleiro da noite e outras fantasias que floreavam os sonhos das mulheres que o assistiam, tentou o inusitado: posou de poeta cantor - ele, seu inseparável violão e um banquinho. Quase foi escuraçado do palco:

- Tira logo a roupa! - gritavam frenéticas as espectadoras. Seu romantismo e inocência foram por água abaixo.

Resolveu seguir uma carreira, digamos, normal. Matriculou-se no curso de engenharia o que não durou nem dois anos. Exato demais para sua alma artística.

Foi para o teatro. Era incrível ver aquele menino retraído sobrar em suas encenações, por momentos até seguras. Não parecia a mesma pessoa! Com um vozeirão firme e aveludado encantava as pessoas, muito embora por vezes se atrapalhasse nas posições.

Conseguiu acompanhar a turnê de Milton Nascimento, Tambores de Minas, como "backing vocal" e talvez esta tivesse sido a melhor oportunidade de sua vida até então. Era o que mais gostava de fazer: a música fazia parte de sua essência. A proximidade de perfis o levou para muito perto de Milton: seres parelhos.

As mulheres continuavam a assediá-lo, como a mãe de outra famosa apresentadora de TV. Numa das cidades em que a trupe estava acabou conhecendo-a. Mais tarde, a fogosa senhora convenceu-o a ir até seu quarto de hotel e maliciosamente convidou-o a chupar com ela uma manga. Saiu do quarto mais que rapidinho. Velha demais! Findo o contrato não se esmerou em manter a amizade conquistada por "não querer incomodar o astro". Faltou-lhe senso de oportunidade.

A sorte ainda iria lhe bater na porta por mais vezes, principalmente no teatro. Grandes produções, grandes diretores... mas faltava-lhe o querer. Seu destino tinha que ser outro. Tinha que ser a música!

Quando não estava encenando ocupava-se com seu inseparável violão. Horas e horas dedilhando, repassando músicas conhecidas, compondo odes de amor a antigas namoradas ou à daquele momento, Mariana que conhecera num espetáculo do então recém aberto parque de diversões o Hopi Hari. Ele o príncipe, ela uma real princesa!

Sua angústia pairava no que fazer; os anos iam se passando e a indecisão só fazia aumentar.

Meu comentário e convite veio momentos após finda a temporada da peça no parque. E para minha surpresa sua resposta foi imediata:

- É disso que eu preciso! Vou contigo!

Meu irmão de coração iria embarcar comigo. Esta decisão foi definitiva para que as coisas realmente acontecessem.

Nenhum comentário: